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Hollywood Fashion Cemetery

HOLLYWOOD FASHION CEMETERY – AMY WINEHOUSE

Voz rouca, delineado expressivo, tatuagens Pin Up, batom vermelho, mini shorts, rosa pink, lenços de cabelo e os coques mais altos que a história da Moda e da Música já viram. A jornada do Hollywood Fashion Cemetery de hoje é bela, melancólica, fashionista, autoral e um legado inestimável para a cultura mundial. Vem com a gente conferir como Amy Winehouse expressava sua forte personalidade por meio de seu guarda-roupas ousado.

Amy Jade para os íntimos, e para o público, Amy Winehouse, nos deixou há 11 anos atrás, mas nunca sentimos que nos deixou mesmo. Isso se deve ao legado que a cantora e multi-instrumentista britânica construiu em seus curtos, porém flamejantes, 27 anos de vida. Amy tinha dentro do peito um coração maior que sua caixa torácica, e por isso viveu cada capítulo de sua vida muito, mas muito intensamente. A jovem londrina podia ter uma voz grave, roupas e makes ousadas, e um pack de tatuagens espalhadas pelo corpo, mas por dentro era uma garota simples, inocente, apaixonada pelas pessoas que a rodeavam (sua família, amigos e parceiros amorosos), tímida. Amy nos fazia sentir que qualquer um de nós poderia ser como ela, porque apesar de um talento absolutamente único, sua personalidade era apenas de uma garota sonhadora. Seus dois álbuns de estúdio lançados em vida contavam com músicas cruas, sem enfeites, como se pudéssemos ler o diário pessoal dela (e ela, os nossos). Com temas frequentes como amor, coração partido, idealizações não concretizadas, vícios e escapismos, Amy comunicava de forma nua e crua como era se apaixonar, sofrer, se entorpecer, amar, e para nós, esse é o maior legado deixado pela cantora. Mas além disso, durante seu tempo sob os holofotes, Amy Jade Winehouse entregou looks ousados repletos de sex appeal, de peças vintage, e de muita autenticidade, o que fez com que seu fashion style se tornasse um dos mais famosos e copiados do mundo. Seu inimitável estilo se concretizou mesmo no universo da moda a partir de 2006, refletindo diretamente nas passarelas com grifes como Dior e Chanel canalizando Amy Winehouse em seus desfiles em 2007 e 2008.

Mas sua paixão pelo estilo vintage tem uma conexão direta com o tipo de música que Amy costumava consumir, e também, produzir. A cantora era fascinada por Jazz, e muito fã de cantores como Frank Sinatra e Tony Bennet, nomes que dominavam esse estilo de música nas décadas de 40 e 50. E sabem o que mais dominava a cultura nessas mesmas décadas? As modelos pin up. Eram chamadas assim as modelos voluptuosas, sensuais, que posavam para propagandas de revista, outdoors, linhas de maquiagem, entre outros. As pin ups eram não só figuras que vendiam sex appeal mas também figuras fashionistas, que inspiraram muito o estilo feminino de se vestir na época, e até hoje influenciam celebridades como Dita Von Teese, Christina Aguilera, Lana Del Rey, Katy Perry, Christina Hendricks e claro, Amy Winehouse herself. Itens como corsets, saltos Mary Jane, decote, hot pants, batom vermelho, delineador marcante, estampa de poá, maiôs e lenços nos cabelos são alguns dos mais conhecidos do estilo pin up. E o diferencial de Amy Winehouse era a mistura perfeita que a cantora conseguia fazer entre penteados e makes vintage com roupas contemporâneas do estilo da época (anos 2000) como mini shorts, regatas coloridas, calças jeans de cintura baixa, vestidos tubinho, entre outros.

Fora dos palcos, Amy também era muito fã de música R&B, sapatilhas de balett, camisas polo e muito, mas muito, devota da cor pink. Algumas dessas influências de moda e música que citamos são muito visíveis já no primeiro álbum da cantora, o aclamado Frank, de 2003. A personalidade forte do disco fez com que Amy e seu estilo particular atingissem a fama rapidamente. Com um título dedicado à Frank Sinatra, e uma identidade visual baseada em uma Amy sorridente cercada de muito rosa pink (nos looks da era, na capa do disco, nos letreiros, etc). Apesar de ser um álbum que fala sobre decepções amorosas, idealizações românticas que nunca se concretizaram e fortes críticas sociais ao povo londrino, esse é um disco que traz, tanto na sonoridade quanto no visual, uma Amy mais feliz.

O coque alto e encharcado de laque, a mecha branca na franja contrastando com os longos cabelos pretos, a mistura de Rock, Pop, Soul, R&B, Jazz e até Ska, fizeram com que Amy se tornasse única. Sua figura era facilmente reconhecida pelos looks sexy que mesclavam uma Amy impecável vinda dos anos 50 com uma Amy despojada e moleca dos anos ’00. E mais reconhecida que sua figura física, somente sua voz rouca e potente. Amy Winehouse tornou-se uma sensação, ultrapassando as barreiras do Reino Unido e ganhando fama mundial. Todos aguardavam ansiosamente pelo próximo projeto musical da cantora. E então veio o seu segundo (e último em vida) álbum de estúdio, o também aclamado pela crítica, Back to Black em 2006. Mas o sucessor de Frank trazia uma vibe mais dark, com muitas músicas sobre coração partido e vício em entorpecentes. A identidade visual e sonora da era Back to Black também se mostrou um pouco mais sóbria, com mais tons de preto e vermelho, uma capa sem Amy sorrindo, e um jazz mais melancólico. Mas foi durante a sua longa era Back to Black (de 2006 até a morte da cantora em 2011), foi quando Amy realmente passou a enxergar o nível de fama que havia atingido. O lado negativo dessa fama é muito conhecido por nós por se tratar de mais um de muitos casos de mulheres assediadas moralmente dentro da bolha de Hollywood, sendo os assediadores a mídia intrusiva, os tabloids sensacionalistas, os Paparazzi incansáveis. Aquela que antes era apenas uma garota britânica com um absurdo talento musical agora não podia colocar os pés na rua sem ser fotografada, não podia cometer erros sem ser julgada, e não podia mais ser dona de sua própria narrativa. A sensibilidade e fragilidade de Amy a levaram à relacionamentos amorosos abusivos e obsessivos, e o coração partido que a cantora carregava por conta de uma relação tóxica com seus pais e marido à levaram a se entorpecer cada vez mais. A cantora viciou-se em álcool e drogas injetáveis para lidar com uma vida da qual ela já não suportava mais. E a cada tropeço de Amy, cada imagem vazada da britânica fazendo uso de drogas, bebendo álcool, ficando inconsciente em festas, baladas, bancos de trás de carros, a jovem de 20 e poucos anos ia se deteriorando cada vez mais e tornava-se uma espécie de piada nos tabloids e programas de televisão. Assim como Hollywood ama uma estrela em ascensão, ela também ama projetar uma queda brutal de seus pertencentes do topo do letreiro até o fim do poço. Mas o lado positivo do alcance que a voz, o estilo e a mensagem de Amy Winehouse carregavam foi o reconhecimento que a cantora recebeu da crítica especializada, e claro, do público. O álbum Back to Black rendeu à ela 5 estatuetas do Grammy, 1 estatueta do Brit Awards e 1 estatueta do MTV Europe Music Awards. As categorias que presentearam Amy com os gramofones dourados foram de Melhor Álbum Pop Vocal, Artista Revelação, Música do Ano, Gravação do Ano, e Melhor Performance Vocal Pop Feminina.

O sucesso estrondoso de Amy lhe rendeu oportunidades que ela nunca havia imaginado para si mesma, como uma apresentação no Grammy de 2008, a gravação de duetos com seu ídolo Tony Bennet, diversas performances nos famosos festivais de música Glastonbury e Lollapalooza, apresentações em diferentes edições do Brit Awards e claro, turnês mundiais. E foi em 2006 que Amy contatou uma conhecida sua, a fashion designer Naomi Parry, e propôs uma parceria fashionista entre as duas. E a partir de então, Parry passou a vestir Amy para todos os eventos, shows e aparições da cantora. No aniversário de 10 anos do álbum Back to Black, em 2016, a própria Naomi Parry escreveu um artigo para a Instyle contando sobre a sua experiência como estilista pessoal do ícone britânico. Em seu depoimento, a designer conta como Amy era cabeça dura, forte e ambiciosa, e como ela tentava reinar dentro de um universo dominado por figuras masculinas. Amy não abaixava a cabeça para nenhum dos homens da indústria e definitivamente não deixava que passassem por cima dela. Naomi Parry comenta que tanto ela quanto Amy tinham uma certa ‘energia masculinana hora de agir, mas na hora de se vestir ambas adoravam elementos muito femininos.

Ela adorava peças apertadas, que ficassem coladas ao corpo, salto alto, cabelo grande, e muito delineador. Um dos últimos projetos que trabalhamos juntas foi a criação de uma linha de vestidos que enfatizavam muito o seu estilo. Eles eram bem vibrantes, bem divertidos, bem curtos…todos inspirados pela turnê Brasileira que ela fez em 2007. Ela amava absolutamente um micro vestido rosa. Ela se sentia muito bem o vestindo. Era perfeito para ela.

A designer também conta, nesse mesmo artigo para a Instyle, que desde que ela conheceu Amy, a cantora já tinha essa paixão por sapatilhas de ballet. Ela costumava usar para tudo, desde andar na rua, até apresentar-se em palcos ao redor do mundo. Amy amava usar salto alto para seus shows, mas depois de uma ou duas músicas se cansava deles, e lá estava Parry no backstage a esperando com uma pilha de sapatilhas de ballet rosa bebê. A estilista revela que Amy usava tanto, mas tanto suas sapatilhas (que tinham que ser especificamente da loja Freed of London) que ela tinha que fazer encomendas de caixas da peça. E como eram muito frágeis, elas estragavam rapidamente e iam parar em uma pilha de ex-sapatilhas, apelidado carinhosamente pela dupla de Ballet Pump Graveyard (Cemitério das Sapatilhas de Balé). Ah, e as sapatilhas deveriam sempre ser de cetim.

E além das claras referências ao estilo pin up das garotas dos anos 50, Amy também incorporava em seu estilo referências fashion das décadas de 60, 80 e 90. Alguns exemplos são os penteados de Brigitte Bardot, o estilo das garotas que andavam com mafiosos e gangsters, a personagem Alabama do filme True Romance (interpretada pela incrível Patricia Arquette em 1993) que é uma prostituta que ao se apaixonar por um homem aficionado por Elvis Presley acaba colocando os dois em uma confusão envolvendo uma maleta repleta de cocaína e muitos, mas muitos mafiosos. Até mesmo o filme Planet Terror (2007), que a cantora assistia obsessivamente era uma inspiração fashion para ela. E sim, esse é o filme em que Rose McGowan têm uma metralhadora no lugar de sua perna direita e mata figuras masculinas de forma sangrenta à la Quentin Tarantino, que ajudou a produzir o longa. E como dito anteriormente pela estilista pessoal de Amy, a cantora adorava vestidos curtinhos e apertados, o que, às vezes, era difícil de encontrar já que Amy era muito magra. Mas Naomi Parry conta que muitos estilistas faziam o micro vestido acontecer para Amy, mencionando grifes como Luella, Betsy Johnson e Dolce & Gabbana. Os vestidinhos costumavam ser decotados, livres de alças, e repletos de cores vibrantes, estampas (floral, xadrez, poá), e paetês. Era o glamour contrastando com uma make mais caseira e desalinhada, transformando Amy Jade em Amy Winehouse, uma artista de estilo único. Em um artigo do jornalista de moda Christian Allaire para a Vogue em 2022, Amy recebeu o título de Eterna Rainha do Estilo Retrô Rockabilly, e seu estilo foi chamado de inimitável.

Entre as muitas influências culturais que Amy e sua estilista citaram como partes fundamentais da construção da persona fashionista Amy Winehouse, também é considerada sua vivência nos bairro de Camden e Southgate em Londres. Os lugares são conhecidos por abrigar os mais diversos tipos de pessoas e estilos como Rockabilly, Punk e Indie, fenômeno que Amy observou de perto desde criança já que era nascida e criada por lá. Outras peças chaves para Amy quando se tratava de moda eram grandes e largos cintos (bem apertados na cintura, dando um aspecto de voluptuosidade e curvas ao seu corpo), pilhas e mais pilhas de lingeries coloridas, brincos de argola dourados e estampas no estilo old school. A fashion designer pessoal da cantora menciona inclusive um cinto específico da marca Arrogant Cat, que Amy não queria tirar por nada nesse mundo. E em relação ao seu estilo fora dos palcos, a britânica gostava da simplicidade de peças contemporâneas como mini shorts, camisas polo, suéteres xadrez, calças jeans e as famosas sapatilhas de ballet feitas de cetim. Ao final de sua vida, Amy já não gostava muito de ter muitas pessoas a rodeando, e não curtia a ideia de carregar ao seu lado toda uma entourage, então ela mesmo passou a escolher seus looks e fazer sua própria make nas turnês e eventos. Naomi Parry revelou à jornalista e redatora Claire Stern em 2016:

Eu não trabalho mais como estilista…Eu trabalhei por um tempo depois (da morte da cantora), mas eu sentia muita falta de trabalhar com Amy. Ela é uma das últimas de sua espécie […] Ela não seguia tendências; ela era apenas ela mesma. Eu penso nela todos os dias“.

Nos dias atuais, Amy Winehouse é lembrada também por seu clássico penteado de coque alto e volumoso, chamado de beehive (colméia), sua versão única do cat-eyeliner (delineado gatinho), LBD (little black dress), sutiãs de cores vibrantes saltando para fora dos vestidos e regatas, pares de shorts cintura alta, flores no cabelo, bandanas, sobreposições, correntes de ouro, saias lápis, skinny jeans e seu famoso piercing acima dos lábios simulando uma delicada pinta. Mas o grande legado de Amy é sua potente voz, que atualmente, é uma das mais facilmente reconhecidas da indústria musical, e as letras de suas músicas, que transbordavam amor, poder e paixão. Sua influência no mundo da moda chegou até mesmo a render uma parceria com a grife britânica Fred Perry. Amy desenhou cerca de 17 peças para a coleção especial, e além de designer de roupas, ela também foi a modelo escolhida para estampar as propagandas e editoriais da marca. Amy contribuiu criativamente desenhando peças como camisas, saias e casacos em um estilo bem clássico atemporal. Sobre essa experiência, a cantora declarou para a edição inglesa da revista Glamour em 2010:

Fiz uma coleção clássica, porque esse é o estilo da marca e o meu é parecido“.

De seu cabelo volumoso às sapatilhas de bailarina, de seus micro vestidos à suas tatuagens old school, de seu delineado preto à mecha branca por descoloração na franja, o estilo eclético e vibrante de Amy Winehouse sempre vai fascinar os amantes de moda. Seu estilo era uma expressão clara de sua personalidade forte e divertida.

Em 2007, Amy Winehouse e seu então marido Blake Fielder-Civil foram fotografados pelo polêmico artista Terry Richardson (acusado de assédio sexual por diversas celebridades). No ensaio, podemos observar um olhar mais cru sobre Amy e sua personalidade moleca e descontraída, contrastando com o visual pin up elegante e sexy e com a maquiagem parecendo impecável nas luzes do estúdio. A cantora é clicada gargalhando, usando dentes de ouro, beijando o marido (que segura uma câmera filmadora, tem como ficar mais anos 2000 do que isso?), mas também é fotografada em poses sensuais, com um ar tímido, intimista, quase romântico. Richardson é um fotógrafo conhecido por clicar celebridades dessa forma íntima e crua, quase sexualizada na maioria das vezes, especialmente mulheres em lingeries. Com certeza é um dos photoshoots que mais captaram a essência de Amy como um todo.

E em 2009, Amy também protagonizou um famoso ensaio de fotos no maior estilo Beachy Mermaid encabeçado pelo fotógrafo Bryan Adams. As fotografias desse ensaio mais tarde serviriam tanto para a capa da edição italiana da revista Vanity Fair, quanto para o aclamado álbum póstumo da cantora “Lioness: Hidden Treasures. O álbum foi lançado alguns meses após a morte de Amy em 2011 e conta com demos nunca ouvidas pelo público antes, covers e novas versões de músicas já conhecidas como uma versão Reggae de Our Day Will Come, um cover em inglês de The Girl From Ipanema (Vinicius de Moraes, Tom Jobim), e um belíssimo dueto com seu ídolo Tony Bennet na faixa Body and Soul. O álbum também foi responsável por apresentar ao mundo a demo do famoso cover que Amy fez da música Valerie. Alguns outros tesouros escondidos no álbum são a parceria de Amy com seu ex-namorado, o rapper Nas na faixa Like Smoke, e a versão original de estúdio da música Wake Up Alone. Toda a curadoria de músicas para o disco foi feita por produtores que trabalhavam com Amy e eram amigos pessoais da cantora, como Mark Ronson e Salaam Remi.

Mas, como já conhecemos a fórmula cruel de Hollywood, Amy não conseguiu cuidar devidamente de seus problemas de saúde física e mental. E sabemos, também, que mais cruel do que a indústria hollywoodiana somente a mídia britânica. Amy sofria de bulimia desde a adolescência, e a devastadora doença misturada com os vícios que a cantora foi desenvolvendo como mecanismo de defesa para lidar com sua relação abusiva com o marido Blake Fielder-Civil, a toxicidade do controle obsessivo de seus pais sobre a sua imagem, e seu transtorno dismórfico corporal (doença que faz com que o paciente enxergue um ou mais defeitos em seu corpo de forma obsessiva) foi fatal. Amy Winehouse carregava consigo um vício em álcool e em drogas entorpecentes como heroína, ecstasy, cocaína e crack. Algumas de suas tentativas de escapismo da realidade eram flagradas por Paparazzi onde quer que ela estivesse, já não existia mais privacidade em sua vida. Qualquer imagem de Amy com um copo de whisky ou vodka em mãos, cigarros entre os dedos, cabelos bagunçados e maquiagem borrada eram imediatamente vazados para tabloids, programas de TV sensacionalistas, sites e blogs de fofoca. A indústria hollywoodiana não tinha interesse em ajudar a cantora a se reabilitar, mas tinha muito interesse em vender reportagens sobre a queda da artista, constantemente expondo todas as suas entradas na rehab, suas chegadas à hospitais por overdoses, e imagens de machucados e arranhões que Amy exibia pelo corpo (resultado de brigas físicas causadas pelo marido agressor). A fraqueza do corpo da cantora era muito grande ao final de sua vida graças ao distúrbio alimentar e o abuso de substâncias tóxicas, e algumas gotas de álcool foram suficiente para que a jovem morresse em 2011 com apenas 27 anos de idade. Esse artigo não tem intenção de abordar a fundo os problemas das quais Amy sofria, e sim, celebrar sua alegria, sua personalidade forte, sua música, seu coração puro, seu estilo fashionista e todo o seu imenso e lindo legado. Mas é importante citar, mesmo que resumidamente, a parte sombria que a sociedade e a indústria de Hollywood tiveram na vida pessoal de Amy Winehouse, afinal, ela era apenas uma jovem garota como muitas de nós que frustrou-se ao não se encaixar em padrões inalcançáveis de beleza, que sofreu por amores não correspondidos, que foi assediada por uma mídia cruel, e abusada por pessoas que ela amava. Infelizmente Amy se foi mas deixou um aprendizado valioso sobre a importância do apoio e tratamento de doenças emocionais. Que nos dias atuais possamos não soltar a mão de nenhuma outra mulher. Mas, que fique claro, o legado que a cantora e musicista deixa para nós é o que deve ser lembrado e celebrado. Muito obrigada por sua influência na música, na moda e na cultura, Amy Jade. E muito obrigada por ter brilhado de forma incandescente como a estrela que era até o fim.

Rest in Power, Amy Jade Winehouse (1983-2011).

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FTV FASHION TELEVISION – ROBYN BROOKS DE HIGH FIDELITY

High Fidelity pode ter sido cancelada após uma única (e cativante) temporada, mas o legado musical da série e os looks vintage de Rob viverão para sempre. Vem com a gente conferir os detalhes dessa curta porém flamejante jornada sobre heartbreaks, camisetas de banda, discos de vinil e muito mais.

Ok, para início de conversa, High Fidelity não merecia ter sido cancelada at all, muito menos após sua única temporada fazer um sucesso estrondoso entre os fãs de televisão, cinema, literatura, moda e música. A série, que é um presente para os amantes da arte, é estrelada por Zoë Kravitz, e sua narrativa é baseada no livro do autor britânico Nick Hornby, publicado em 1995. A obra literária foi um sucesso de vendas, e gerou, antes da série com Kravitz, uma obra cinematográfica clássica dos anos 2000. O filme, cujo título é o mesmo do livro e da série, é estrelado por John Cusack, Jack Black e Lisa Bonet (sim, a mãe de Zoë Kravitz na vida real), e traz como protagonista o dono de uma loja de discos de vinil. E Rob Gordon, nosso protagonista, além de colecionar discos, também coleciona relacionamentos amorosos fracassados e uma excêntrica personalidade. Após ser deixado por mais uma namorada, Rob resolve revisitar seus mais marcantes relacionamentos do passado em busca de uma resposta para o alto nível de namoros fracassados que ele empilha junto aos seus discos na sala de casa. E no reboot de 2020, Zoë Kravitz chega trazendo um diferencial: a representatividade. Sim, porque enquanto o Rob de Cusack era homem, branco e mantinha apenas relacionamentos com o sexo oposto, a Rob de Kravitz é mulher, negra e bissexual. Mas, claro, as duas produções têm muitas similaridades, já que ambos protagonistas quebram a quarta parede e falam diretamente com o espectador, revivem seus relacionamentos passados, colecionam corações partidos e são proprietários de uma loja de discos, com a única diferença sendo a localização, já que a versão cinematográfica se passa em Chicago e a versão televisiva se passa especificamente no bairro Crown Heights, no Brooklyn (New York). E a Rob de Kravitz não deixa de fazer uma homenagem fashionista ao Rob de Cusack, usando a mesma camiseta vintage da Dickies que ele exibe no filme.

Mas, além da narrativa fascinante que Robyn Brooks, ou Rob para os íntimos que conversam com ela por meio da quebra da quarta parede, nos conta ao longo dos 10 episódios da série, outros dois fatores da produção se tornaram alvos de fascínio do público: o figurino e a trilha sonora. Rob é uma mulher de personalidade forte, e apesar de exibir características modernas e ‘pra frentex‘, seu guarda-roupas é repleto de peças vintage. Camisetas antigas de banda, calças xadrez, Vans sutilmente sujos, saias plissadas, blusas evidentemente usadas e desgastadas (e até mesmo com enormes manchas de café).

Uma característica chamativa do figurino de Rob é a mistura de peças românticas (tons pastéis, cardigans de tricot, estampa florida, borboletas, saias rodadas, scrunchies segurando seu longo rabo de cavalo) com peças que remetem ao estilo grunge (coturnos, camisas e vestidos de estampa xadrez, maxi t-shirts, sneakers). Rob parece ter a casca dura por fora, com seus looks ousados, dezenas de tatuagens espalhadas pelo corpo e um baseado sempre em mãos, mas em seu interior, a personagem é frágil, romântica e, às vezes, até inocente. Por isso o trabalho de figurino da produção de High Fidelity em parceria com a própria Zoë Kravitz é tão relevante, ele reflete a personalidade da protagonista.

E além de observarmos os looks de Rob no seu dia-a-dia comandando a Championship Vinyl Records, nós também temos acesso aos outfits que Rob usa quando está sozinha em casa conversando conosco, e seus outfits de rolês, já que a gata também se mostra uma ótima DJ e uma assídua frequentadora de bares. Um fato sobre Rob é que ela ama uma loungewear, aparecendo diversas vezes com robes, calças de seda e cetim, camisetas larguinhas, pijamas, underwear, regatas, meias de cano alto e chinelos (sempre acompanhados de um baseado e uma taça de vinho).

Mas se engana quem pensa que por trás dos looks desleixados‘ de Rob não existe um figurino repleto de etiquetas das maiores grifes do mundo misturadas à tais peças vintage de brechó. Entre alguns exemplos, Kravitz veste uma regata City Scape Mesh da Jean Paul Gaultier tanto em um flashback quanto no presente enquanto fala ao telefone (ênfase em telefone, afinal, é um telefone com fio). E combinando com a blusa alaranjada Gautier, Rob exibe uma calça xadrez Maison Margiela que contrasta com os Vans Old Skool sujos e desgastados que ela tem nos pés. E lembram quando mencionamos o quanto a Rob ama roupas confortáveis? Um exemplo é a combinação de band t-shirt com calças verdes de cetim, que tem uma vibe grunge loungewear, e a combinação de jaqueta jeans vintage com um par de calças baby peach também de cetim, mas dessa vez dando um ar mais romântico ao look.

E os looks de rolê por NYC da Rob não ficam para trás, já que a gata mistura croppeds coloridos (o com estampa de borboleta que ela veste na foto acima nos lembra muito as peças da coleção de Outono de 1991 da grife Alaia), jaquetas de couro, trenchcoats, jaquetas puffer, botas de cano médio, muito mom jeans, cintura alta e acessórios sempre dourados complementando tudo. E outra coisa que a Rob é uma fã de carteirinha e fez com que nós fossemos também? Camisas havaianas. E aparentemente, de acordo com a figurinista da série, Sarah Laux, as camisas havaianas não foram colocadas em tantas cenas de propósito.

Em uma entrevista para a edição online da Harper’s Bazaar, Laux contou que se juntou com a própria Zoë Kravitz para criar o estilo de Rob, e as duas compartilharam muitas idas à brechós e até mesmo ao closet pessoal de Kravitz.

“Um dia eu percebi que a gente tinha uma tonelada de camisas havaianas, e foi meio que por acidente. Eu acho que o acidente meio que ocorreu porque Zoë e eu simplesmente as amamos muito”.

Sarah Laux também mencionou durante a entrevista que 90 por cento das peças que vemos Rob usar na série são, de fato, vintage, já que Zoë Kravitz é uma amante de brechós e roupas antigas. A figurinista também revelou que foi ideia de Kravitz manter o closet de roupas de Rob bem enxuto, já que ela é uma garota nova iorquina sem muito dinheiro. E o jeito desleixado cool de Rob? Também foi proposital e uma escolha da atriz, que queria que as roupas refletissem a personalidade da personagem, que não era nada certinha.

E apesar da série se passar nos dias atuais (em 2020, no caso), o estilo vintage da Rob é uma grande homenagem aos anos 90, talvez um ode à obra literária, que foi publicada em 1995? Não sabemos. Mas o que sabemos é quais foram as inspirações fashionistas da década de 90 que Laux e Kravitz escolheram dentre muitas. A figurinista contou:

“Foi muito como uma homenagem à Kurt Cobain, Drew Barrymore, Winona Ryder, e até mesmo algumas peças que Liv Tyler usa em Empire Records, ícones da cultura jovem, coisas relacionadas à música”.

Ao ser questionada sobre as suas partes preferidas do figurino de Rob, Sarah Laux relevou que sua lista inclui as botas plataforma, os casacos de couro, as camisas e camisetas vindas do closet de Kravitz, e o fato de tudo ser vintage de verdade. Mas os fãs do guarda-roupa da personagem vão ter dificuldade em encontrar peças iguais às que ela exibe na série. As botas plataforma, por exemplo, ‘não existem’ já que foram baseadas em um par de Helmut Lang que Zoë possui, e a recriação delas foi feita especialmente para a série por um sapateiro britânico (o par de botas Helmut Lang que serviu de base está esgotado em todas as lojas físicas e virtuais desde que Kravitz as divulgou). Os casacos de couro são uma representação de armadura, algo que protege a frágil Robyn Brooks do mundo e são uma ode direta ao casaco de couro preto que John Cusack usa no filme de 2000. O protótipo de uma das jaquetas de Rob, inclusive, foi feito com base em um casaco Banana Republic que uma amiga (também figurinista) de Laux possuía.

E algumas das peças que saíram direto do guarda-roupas de Zoë Kravitz herself foram o robe estampado que Rob sempre usa em casa, a camisa havaiana verde que aparece tanto nas fotos promocionais da série (surpreendentemente combinando com um shorts de poá e botas plataforma) e durante a própria série (combinada com uma regata branca, um belíssimo par de calças lilás e loafers nos pés), as inúmeras camisetas de banda como as do Wu-Tang Clan, David Bowie e Beastie Boys, e o nosso item preferido: a mini saia plissada Saint Laurent. O restante das maxi t-shirts que Rob exibe ao longo da série e outras peças foram garimpadas de brechós em NYC como Goodwill, Manhattan Vintage, Resurrection, Beacon’s Closet, Buffalo Exchange e Forty Five Ten. A figurinista Sarah Laux revelou que a icônica regata longa com o rosto de Bob Marley estampado foi garimpada em um brechó em Nashville (Tennessee).

E como a série gira em torno do cenário musical, e cada música possui um significado na vida de Rob (memórias, amor, términos, sexo, trabalho, descanso, histórias, amigos, ex-amores, atuais amores, etc), é claro que não podíamos deixar de falar sobre essa incrível curadoria musical. A trilha sonora que embala a série e a jornada de autoconhecimento que Robyn Brooks nos conta também teve muita influência de Zoë Kravitz, já que a gata é filha do rockstar Lenny Kravitz e ela mesma comanda a banda de eletropop e R&B LOLAWOLF junto com o produtor musical e baterista Jimmy Giannopoulos desde 2014. A curadoria musical da série conta com nomes como Fleetwood Mac, Prince, David Bowie, Notorious B.I.G, Outkast. Blondie, Frank Ocean, Marvin Gaye, Frank Zappa, Aretha Franklin, Grateful Dead, Beastie Boys, Jimi Hendrix, Nina Simone e muito mais. E além dos nomes de peso citados acima, a trilha sonora também conta com uma velha guarda de peso (aliás, de carga máxima) de artistas brasileiros como Os Mutantes e Serguei. É impossível numerar a quantidade de música boa que nos é dada de presente por essa série, mas é possível apreciar o quão eclética e representativa a sonoridade de High Fidelity é.

Infelizmente não somos donos da Championship Vinyl Records e não temos como colocar toda essa mistura sonora maravilhosa para tocar em uma vitrola para vocês. E apesar de não existir comparação entre o som do bom e velho vinil e o som dos serviços de streaming de música, vamos deixar aqui a playlist oficial feita pela produção de High Fidelity no Spotify.

Rest in Power, High Fidelity. E vida longa à fashionista Robyn Brooks.