O polêmico termo dá nome a uma bizarra mistura de moda e lifestyle cujas principais características dos adeptos eram as olheiras aparentes, cabelos sujos e bagunçados, androginia, magreza extrema e qualquer traço físico que remetesse ao uso de drogas, em especial, a heroína. De onde surgiu o conceito? Quando esteve em alta? Quem eram os adeptos? E o mais importante, a discussão sobre a linha tênue entre o que é expressão de estilo e o que é um sinal de alerta da sociedade para si própria.
A década de 80 popularizou algumas das maiores modelos de passarela da história, como Cindy Crawford e Claudia Schiffer. As estrelas dessa onda fashion eram mulheres magras mas voluptuosas, que vestiam roupas altamente coloridas e estampadas, muito neon, cabelo impecavelmente arrumado e que vendiam um lifestyle de “magreza como sinônimo de saúde”, incentivando exercício físico e dietas repletas de alimentos saudáveis (a famosa época da popularização das fitas cassete de ginástica para fazer em casa, protagonizadas por celebridades). Mas quando o mundo da moda menos esperava, uma adolescente rebelde e de estilo punk foi casualmente fotografada exibindo seu estilo ‘cool girl‘ em uma pista de dança, e sua foto foi parar nas mãos de grandes empresários do ramo fashion, fazendo com que a garota, a jovem norte-americana e filha de italianos, Gia Carangi, se tornasse o novo rosto da moda. Acontece que a rebel girl, apesar de esbanjar talento como modelo, em poucos anos caiu direto das capas de revistas renomadas ao anonimato total. O grande culpado da queda da estrela em ascensão foi o seu vício em heroína, droga que estava se popularizando naquela época, e que, por ser injetável, deixava marcas e feridas pelos corpos dos usuários. Gia não era mais convidada a desfilar ou posar para grandes fotógrafos (ou qualquer fotógrafo) por conta de suas visíveis marcas de injeção, e eventualmente, por sua fadiga que era causada majoritariamente pela mistura de seu vício em drogas e bebida com a doença de AIDS que a modelo contraiu devido ao uso contínuo de seringas comunitárias. Ao final da década de 80, Gia já havia sido levada pela doença, aos 26 anos de idade. Um filme sobre sua breve e selvagem vida foi feito em 1998, com Angelina Jolie no papel principal.
Gia Carangi é muitas vezes apontada como a pioneira do estilo Heroin Chic, já que exibia looks repletos de cores sóbrias, jaquetas de couro, olhos fundos tingidos de preto, cabelo desarrumado e estava sempre com um cigarro e um copo de bebida em mãos. Além de, claro, apresentar um vício em heroína. Apesar de sua vida, e carreira, terem sido terminadas tão rápido, Gia é até hoje apontada como a primeira Supermodel do mundo. Com a chegada dos anos 90, novos rostos estampavam as revistas de moda e exibiam seus catwalks pelas passarelas, mas com um novo, e radicalmente, diferente estilo do popular na década anterior. As Supermodels estavam em alta e eram cada vez mais esbeltas, de maneira visivelmente não saudável, e as cores sóbrias vieram como uma antítese às cores vibrantes dos anos 80. E foi nessa mesma época que movimentos culturais como o Grunge atingiram o público jovem em cheio, trazendo para dentro do mundo da moda a glamurização das drogas. A droga da qual estamos falando especificamente nesse artigo, a heroína, era considerada ate então uma droga nada glamurosa, já que além de envolver picadas de agulha pelos braços e pernas dos usuários, ainda foi uma das grandes responsáveis pela epidemia de AIDS nos EUA e Europa. Mas com novas versões da droga chegando ao ‘mercado’ norte-americano e britânico, onde os jovem podiam simplesmente inalar a substância, o estigma e a marginalização da heroína deram espaço para a ascensão dela entre os jovens de classe média alta.
E a nova droga do momento acompanhava, sem faltar, os músicos da era Grunge que estavam em crescente como os membros das bandas Nirvana, Pearl Jam, Smashing Pumpkins, Alice in Chains, Hole e Stone Temple Pilots. E também passou à acompanhar as topmodels mais desejadas e copiadas do mundo, como por exemplo, as maiores precursoras do Heroin Chic, a britânica Kate Moss, a belga Tanga Moreau e a estadunidense Jaime King. A cantora Fiona Apple também aderia ao estilo de vestir-se da polêmica trend. E a bolha de Hollywood também garantiu sua entrada na nova era fashion com atrizes como Chloë Sevigny e Angelina Jolie exibindo não apenas os looks mas também os vícios em entorpecentes. Quando se ligava a televisão ou ia ao cinema, era cada vez mais comum dar de cara com protagonistas fictícios viciados em drogas, afinal, os anos 90 nos trouxeram clássicos cinematográficos como Pulp Fiction, Kids, Girl Interrupted e Transpotting.
As passarelas e photoshoots foram tomados pela maquiagem apagada, o aspecto de ressaca de balada, os cabelos cheios de nós aparentes, o batom escuro borrado, os ossos expostos, o cigarro e a sujeira misturados inusitadamente à peças de roupas luxuosas como casacos e coletes de pele, bolsas de grife, jaquetas de couro, salto alto, e campanhas publicitárias para grifes de alta costura. Alguns dos ensaios fotográficos mais conhecidos por terem abordado de forma ‘glamurosa’ o Heroin Chic foram as dos perfumes da marca Calvin Klein em 1993. Os ensaios traziam estrelas como Kate Moss, Jaime King e Vincent Gallo.
E por trás das ‘musas’ do Heroin Chic, estavam os fotógrafos e artistas que ajudaram a criar esse conceito e torna-lo pop. Os principais nomes da cena são os da inglesa Corinne Day e o do italiano Davide Sorrenti, que fotografaram inúmeras vezes as modelos citadas acima, além de, eles próprios serem usuários de heroína. A criação do conceito de Heroin Chic em forma de editoriais de moda não era suficiente para os fotógrafos, que levaram o lifestyle perigoso para suas vidas pessoais, causando a morte precoce de Sorrenti aos 20 anos de idade por uma suposta overdose da ‘glamurosa’ droga. Com a morte do artista, em 1997, todos os billboards e as revistas cessaram, quase imediatamente, a exibição do estilo Heroin Chic. A fotógrafa de moda Francesca Sorrenti, mãe de Davide, alegou que o filho sofria de alguns problemas de saúde, e que uma quantidade muito pequena de heroína foi encontrada em seu sangue, mas que isso já foi suficiente para conectarem a morte do jovem à tal febre da ‘heroína chic‘. Francesca declarou também “Isso é heroína. Isso não é chic. Isso tem que parar, essa heroin chic“. Após a morte do filho, Francesca juntou-se a outros nomes da moda e da fotografia para criar uma campanha contra as drogas. Sobre essa conquista e o legado do filho, ela declara “[…] salvou a vida de muitos jovens e acabou de vez com o heroin chic […] Esse é o seu legado, e é um dos bons.”
O controverso mas também muito querido fotógrafo foi celebrado em um documentário biográfico chamado See Know Evil, com fotos pessoais, relatos de familiares e amigos, filmagens caseiras de sua adolescência, e depoimentos de celebridades que passaram bastante tempo ao seu lado como a própria Jaime King, Mila Jovovich, e outros. O documentário é descrito como uma visão sem censura da vida e obra do fotografo fashion dos anos 90 e ícone cultural da juventude da época.
Já o outro nome que ajudou a dar vida ao Heroin Chic no mundo da fotografia e dos editoriais de revistas foi a britânica Corinne Day, que costumava trabalhar como modelo mas, em uma viagem a Ásia, acabou descobrindo sua paixão em ficar atrás das câmeras ao invés de a frente delas. A fotógrafa alcançou sucesso ao ser contratada pela revista conceitual The Face, e sua primeira (e mais marcante) musa escolhida foi uma ‘magricela‘ de ‘beleza crua‘, uma ainda desconhecida Kate Moss adolescente. A partir do lendário editorial de 1990 onde Kate aparece de topless, com um cocar na cabeça e sem maquiagem, os nomes das duas artistas foram direto ao topo da indústria da moda. Corinne Day foi a responsável por fotografar a primeira capa de Kate Moss para a Vogue Magazine em 1993, mas seu estilo de fotografia era mais ‘caseiro’ já que ela tinha uma paixão por fotografar pessoas conhecidas e amigos, e focar em exibir imperfeições corporais e o naturalismo da vida. A fotógrafa também clicou nomes como Linda Evangelista, Gisele Bündchen, Alexander McQueen e Kirsten Dunst.
A heroína era predominante da cidade de Seattle, que até mesmo foi classificada por Courtney Love como “a meca das drogas, onde a heroína é mais fácil de se obter do que em San Francisco ou Los Angeles“. A vocalista da banda grunge Hole sabe muito bem do que está falando, já que convivia diariamente com os membros da cena musical de lá, e inclusive foi casada com Kurt Cobain, vocalista da, hoje, mais conhecida representante do estilo grunge, a banda Nirvana. Grandes nomes da música da década de 90 como Kurt Cobain, Mike Starr (Alice in Chains) e Jonathan Melvoin (The Smashing Pumpkins) eram usuários da droga e morreram ou por overdose ou por fatores que desencadeavam seus vícios, como as doenças emocionais. O que a estimulante cocaína representava nos anos 80 era socialização, diversão, celebração e energia como um reflexo daquela década que era repleta de pessoas ‘felizes e animadas’, enquanto a heroína representava um refúgio de seus problemas e dores, um casulo para te proteger de um mundo cruel, por isso era tão famosa entre artistas que sofriam de depressão, ansiedade, bipolaridade, etc. Os jovens já não se sentiam representados dentro de uma sociedade que exigia felicidade constante, alta energia que causava exaustão, e roupas que se vendiam graças à modelos e artistas sorridentes montados em esteiras de academia e cobertos de tinta neon.
O fotógrafo Davide Sorrenti era namorado da modelo e atriz Jaime King, e como mencionado anteriormente, ambos eram viciados em heroína e adeptos do estilo Heroin Chic. Duas das imagens mais populares e assustadoras desse período são fotografias feita por Sorrenti que clica Jaime King em P&B espetando uma seringa cheia em seu corpo e rasgando sua calça com uma faca, enquanto exibe uma aparência apática sentada em um imundo sofá. A romantização das drogas e da magreza excessiva estavam começando a alarmar o público mainstream. Aliás, outra característica dessa época era produzir ensaios fotográficos caseiros, com fotos desfocadas e maquiagem desleixada. Os cenários dos tais photoshoots incluíam quase sempre quartos, hotéis, carros e banheiros, todos repletos de pacotes de cigarro, garrafas de bebida, pilhas de roupas jogadas, isqueiros, e parafernálias que mostrassem a bagunça do ambiente num geral. E os looks não eram tão glamurosos como os que as musas do Heroin Chic gostavam de exibir nas saídas dos Night Clubs, e sim roupas rasgadas, manchadas, extremamente largas, e até lingeries. Os pés muitas vezes estavam descalços e imundos, mas não faltava sombra nos olhos e batom nos lábios.
Apesar do polêmico estilo ter criado uma má fama, sendo considerado responsável pelas mortes e overdoses de milhares de jovens, o Heroin Chic só começou a desaparecer quando o então presidente dos EUA, Bill Clinton, deu uma declaração em 1997 de que “a indústria fashion estava há anos fazendo com que o vício parecesse sexy e cool, o que não era saudável“. Esse discurso deu-se a partir da morte do fotografo Davide Sorrenti, 3 meses antes. Durante o documentário biográfico sobre Sorrenti See Know Evil (2018), é possível ouvir mais polêmicas falas do presidente Clinton sobre a indústria da moda. A partir de então, o mundo da moda passou a investir novamente na ideia de que as modelos eram saudáveis, cheias de vida, sensuais, e o principal rosto dessa transformação foi a Supermodel Gisele Bündchen. A modelo recebeu uma matéria da Vogue inteira sobre ela com o título “O Retorno da Modelo Sexy“. Apesar de Gisele ser tão magra quanto todas as outras modelos da década de 90, ela parecia ser um novo rosto por ser uma brasileira (pele bronzeada, seios grandes, e um derrière, como dizem os franceses, mas que nós chamamos de bunda mesmo). A própria Gisele Bündchen admitiu que foi o principal rosto dessa mudança na indústria das passarelas em uma recente participação na conta oficial de youtube da Vogue Britânica (Vogue UK). A supermodel disse o seguinte enquanto revisitava seus mais icônicos looks ao longos dos anos no quadro Life in Looks:
“[…] Eu me lembro de ir à todos esses castings na época e ninguém querer nem olhar o meu portfolio porque estávamos na Era Heroin Chic e eu não me parecia nada com o heroin chic, obviamente […]”
Ainda durante a sua participação no quadro Life in Looks, Gisele também comentou sobre a famosa capa de 1999 da Vogue, que foi estampada por diversas modelos icônicas juntas, inclusive a modelo brasileira bem ao lado de Kate Moss.
“Essa foi uma capa com Kate, Iman, Lauren Hutton, eu. Eu tinha 19 anos, foi muito especial estar lá com aquelas mulheres lindas. Era como se representassem as modelos de cada ano […] Eu era considerada o rosto dos anos 2000, e Kate era dos anos 90.”
O grande ponto de virada foi justamente na transição de uma década para a outra, já que no ano de 2000, Gisele estampou pela primeira vez sozinha, a capa da revista Vogue. O ensaio, que foi fotografado por Irving Penn e roteirizado por Philip Weiss, tinha o título “The Return of the Curves” (O Retorno das Curvas). Sobre esse acontecimento, a modelo Nicole Phelps declarou “A ironia de Gisele ser colocada em uma edição da revista sobre curvas […] É que ela era tão magra quanto as modelos que a antecederam, mas ela era alta, ela tinha seios, ela tinha uma bunda, e isso a tornava suficientemente diferente a ponto de representar a ideia de curvas.”
Mas será mesmo que as rebel girls que eram adeptas ao Heroin Chic deixaram o lifestyle para trás? Será que a sombria era fashion não ganhou novos seguidores?
O Heroin Chic reapareceu na segunda metade dos anos ’00s e perdurou até meados dos 2010‘s, porém em nenhum momento foi chamado pelo seu verdadeiro nome. A epidemia de heroína já não era grande como na década de 90, mas o estilo desleixado, as fotos caseiras, a maquiagem borrada, os casacos de pele combinados com roupas rasgadas, o consumo de cigarros e bebida, isso foi o que permaneceu como legado do Heroin Chic. Fashionistas como a atriz Lindsay Lohan e as socialites Paris Hilton e Nicole Ritchie passaram a tornar comum o uso de entorpecentes, as DUI’s (dirigir sob o efeito de álcool ou narcóticos), casacos de pele animal contrastando com calças jeans de cintura baixa rasgadas, pacotes de cigarro e copos enormes de café ou bebida energética. Passou a ser rotineiro ver as estrelas teen do momento farreando em baladas até o dia amanhecer e os tabloides eram infestados de fotos das garotas bêbadas, vulneráveis, de ressaca, desarrumadas. O lifestyle delas foi duramente criticado pela mídia da época, mas os amantes de moda e cultura pop estavam obcecados pelos looks e polêmicas que elas entregavam. Esse fascínio do público em querer saber cada vez sobre as vidas pessoais das celebridades, e dos jovens sentirem o desejo de copiar as roupas e modo de vida frenético dos ídolos fashion chegou ao seu pico por volta de 2007, perdurando até meados dos anos 2010’s. Mas foi o estilo Tumblr Girl, por exemplo, um dos responsáveis por atingir garotas e garotos do mundo inteiro, mas dessa vez não foi por meio de revistas e campanhas publicitárias, e sim por meio da internet. Nomes grandiosos de Hollywood ou da cena musical do novo milênio exibiam o que sobrou do estilo Heroin Chic quando fotografadas nas ruas, nas saídas das baladas, em suas fotos caseiras tiradas com câmeras digitais e celulares. Nomes estes como as cantoras Lily Allen e Sky Ferreira, as atrizes e fashion designers Mary–Kate e Ashley Olsen, e a atriz Kaya Scodelario (que exibia o estilo tanto na vida real quanto nas telas com sua icônica personagem Effy Stonem, na controversa série britânica Skins) são alguns exemplos. E não poderíamos deixar de citar a controversa capa da revista Vanity Fair que trazia a jovem Miley Cyrus em 2008 seminua e exibindo um look apático, pele vampiresca e ossos expostos pela magreza excessiva.
E não podemos deixar de lembrar que foi durante essa mesma época do extremo fascínio pela cultura pop e celebridades ‘trashed‘ que aconteceram os famosos assaltos às mansões de celebridades de Hollywood. Os assaltos eram feitos por um grupo de adolescentes residentes da cidade de Calabasas (Califórnia), que fica ao lado de onde as estrelas da música e do cinema tentam viver uma secreta e quieta vida. A ‘gangue de Hollywood‘ ficou mundialmente conhecida como “The Bling Ring” e foram oficialmente expostos aos tabloides graças à jornalista Nancy Jo Sales que entrevistou um dos membros do grupo, transformando a entrevista no incrível artigo “The Suspects Wore Louboutins” para a revista Vanity Fair em 2011. Esses e muitos outros jovens da época estavam obcecados com a chegada de redes sociais como Twitter, Facebook e Myspace que permitiam acesso à fatos particulares das vidas, até então, secretas das celebs. E também foi graças à essa obsessão com as rebel girls que houve um aumento gigantesco na produção de reality shows em canais de TV norte-americanos como a MTV e o E! Entertainment Television que mostravam o dia a dia de jovens ‘ricas e problemáticas‘. Um dos maiores exemplos dessa ‘febre’ foi o reality Pretty Wild que seguia a rotina de 3 irmãs adolescentes que desejavam entrar para Hollywood a qualquer custo. Uma dessas garotas era ninguém mais ninguém menos do que Alexis Neiers, uma das mentes por trás dos roubos cometidos pelos Bling Rings (e condenada à seis meses de prisão). Alexis também era usuária de diversos tipos de entorpecentes, o principal deles sendo, vocês adivinharam, a heroína. Mas vamos deixar todos os detalhes polêmicos sobre a gangue de Hollywood para um artigo especial sobre eles.
O estilo foi timidamente tomando forma novamente e fazendo aparições em editoriais de moda, séries e filmes de sucesso, palcos de festivais, e nos primórdios de apps como Tumblr e Instagram. Outras adeptas do estilo desleixado foram a modelo Rosie Huntington–Whiteley, a frontwoman da banda The Pretty Reckless, Taylor Momsen, e até alguns editoriais de moda aderiram ao ressuscitado estilo, colocando, por exemplo, a modelo e atriz Cara Delevigne como um rosto ‘trashed‘ e rebelde das campanhas.
Em 2016 a Hunger TV definiu um novo conceito para esse Heroin Chic Style contemporâneo que surgiu com a chegada da internet:
“Em 2016, a referência ao ‘heroin chic‘ é um código para: calças jeans rasgadas e roupas oversized, cabelo descolorido, projetos de fotografia de ensino médio, blogs de fãs dedicados à Kate Moss, círculos pretos embaixo dos olhos, banheiras imundas, biografias de Kurt Cobain na mesa de centro da sala, possivelmente ter o álbum Back to Black de Amy Winehouse em vinil, campanhas publicitárias vintage de Calvin Klein, e ser muito, muito fã de Sky Ferreira“.
Podemos observar que o Heroin Chic renasceu mas trouxe consigo apenas a estética trashed, e não necessariamente aquela antiga glamurização da heroína e de outras drogas ilícitas. Os novos adeptos queriam parecer desleixados e drogados sem de fato estarem, apenas pelo aesthetic. Mas será que isso pode ser considerado uma real tendência de moda? Há quem responda que sim, e quem repudie qualquer referência ao estilo desde 1997 com a morte de Davide Sorrenti. Aos que acreditam no Heroin Chic Style como apenas uma estética e um figurino, e não como uma forma de viver e apoiar o uso de drogas, o estilo apresenta apenas o defeito de ser nomeado ‘heroína chic‘, já que expressa a polêmica junção de dois mundos muito distantes: a dependência de drogas e a decadência que o vício causa contrastando com uma vida repleta de dinheiro, glamour e luxo. Nas palavras de Jefferson Hack, co-fundador da famosa mídia de moda e beleza Dazed:
“O mundo da moda tem a responsabilidade de lidar com problemas. Seria muito mais destrutivo se a moda exibisse apenas pessoas sorridentes e felizes. O mundo da moda têm tido que lidar com problemas da vida real desde a década de 80, e a heroína já infiltrou-se em todas as áreas da sociedade. Ignorar isso é perigoso”.
Há críticos de moda e historiadores que acreditam que o Heroin Chic era muito menos sobre o uso da romantização do vício em drogas como forma de vender roupas, mas muito mais a moda refletindo os sentimentos da população da época. Considerando que as décadas que antecederam os ’90s foram todas construídas a base de capitalismo selvagem, imagens de mulheres impecáveis e pessoas ‘sem defeitos ou problemas‘ contrastando com horríveis acontecimentos históricos como guerras, serial killers à solta e uma assustadora crescente da tecnologia, faz todo o sentido que a última década daquele século refletisse o resultado de toda essa bagunça anterior. No artigo High Fashion, Heroin Chic da Hunger TV, o autor Max Grobbe declara:
“[…] As acusações de que a moda estava conectada ao uso de drogas é infundada? Não. Mas é mais controverso do que o uso de drogas no mundo do esporte competitivo? Na cena musical? No mundo coorporativo? Não. As drogas, sorrateiras como são, podem se infiltrar em qualquer indústria que gere lucros […] A popularidade do estilo heroin chic ao final do século é uma reação à apatia do sucesso do capitalismo e ao tédio que a cultura pop emanava nos grunge anos 90.”
Nós do SXSD não somos a favor da romantização de qualquer entorpecente como forma de se expressar no mundo da moda, mas o debate sobre essa e outras controversas tendências fashion devem existir. E caso sejam uma ameaça à vida dos adeptos e tornem-se uma epidemia, devem ser combatidas. O importante é manter a discussão saudável e ouvir o que profissionais das áreas de moda, cultura e saúde têm a dizer, sempre. E você, já tinha ouvido falar no polêmico Heroin Chic? Tem uma opinião ou um depoimento sobre? Queremos ouvir tudo.